Grupo tem membros de Burkina Fasso, Camarões, Burundi e Guiné-Bissau
O Ministério das Relações Exteriores adicionou um ingrediente inusitado à sua diplomacia para a África: além de cooperação em áreas como saúde e biocombustíveis, o Brasil está oferecendo aos países africanos o seu know-how em futebol.
Na última segunda-feira (22), convidados pelo Itamaraty, 16 técnicos de futebol do Benin, Burkina Fasso, Camarões, Burundi e Guiné-Bissau participaram em São Paulo da abertura do 27º Curso Nacional para Treinadores de Futebol, promovido pelo sindicato paulista da categoria.
Na sede do Corinthians, ao lado de outros 107 treinadores ou aspirantes a treinadores brasileiros, eles assistiram a uma palestra com Carlos Alberto Parreira, técnico tetracampeão mundial pelo Brasil em 1994.
Até o fim de semana, o grupo terá aulas práticas e teóricas com outros treinadores brasileiros (entre os quais outro que passou pela seleção, Luiz Felipe Scolari, o Felipão), assistirão a um jogo do Campeonato Brasileiro e visitarão o Museu do Futebol, no estádio do Pacaembu.
Excelência
"O Brasil quer usar a sua excelência no futebol para expandir relações com outros países de uma forma positiva" , diz a diplomata Vera Cíntia Alvarez, que chefia a Coordenação Geral de Intercâmbio e Cooperação Esportiva do Itamaraty.
O órgão, conta Alvarez, foi criado em 2008 pelo chanceler Celso Amorim para atender a uma demanda antiga, que cresceu nas 12 visitas do presidente Lula à África.
"Cada vez que o presidente encontrava políticos africanos, o tema futebol vinha à tona, e eles pediam nossa ajuda para fortalecer o esporte, para melhorar suas seleções", diz a diplomata à BBC Brasil.
Desde a criação da unidade, profissionais do futebol africano (e do Timor Leste) já haviam sido convidados a participar de três cursos no Brasil, dois para treinadores e um para árbitros.
Alvarez diz que os escolhidos, cerca de 20 por curso, são indicados pelas federações locais e têm os currículos avaliados pelas embaixadas brasileiras. São priorizados os que já tenham alguma projeção, como técnicos de seleções nacionais ou de times da primeira divisão.
"Queremos que eles sejam replicadores do que aprenderam e que levem aos seus países a ideia de que o esporte pode ser usado para o desenvolvimento", diz Alvarez.
Ela conta que a meta do Itamaraty é patrocinar a vinda ao Brasil de quatro turmas por ano. Também se pretende formar um grupo com treinadores de língua espanhola, para atender à demanda de países da América Central.
A diplomata diz não saber qual o custo do programa, financiado pela Agência Brasileira de Cooperação.
Blocos e fones de ouvido
Campeão mundial em 1994, Parreira já treinou outras cinco seleções
Na abertura do curso, quase todos os 16 técnicos africanos acompanhavam a palestra com fones de ouvido - havia tradução para o francês - e blocos de anotações.
Queriam registrar cada palavra de Carlos Alberto Parreira, um dos treinadores brasileiros com maior projeção internacional - além do Brasil, ele já comandou outras cinco seleções, entre as quais a da África do Sul.
Ironicamente, porém, eles o ouviram analisar não o futebol brasileiro, mas sim o do Barcelona e o da seleção espanhola.
Ao longo de uma hora e meia, Parreira elogiou a estratégia das equipes e os seus jogadores, enquanto um telão projetava fotos de partidas dos dois times.
Ao fim da palestra, Niyongabo Amars, técnico-assistente da seleção de Burundi, pequeno país no centro da África, não parecia frustrado com a escolha do tema.
'Hoje Barcelona e Espanha estão em alta, e vocês, em baixa', disse ele, jocoso.
Treinador da seleção sub-20 de Camarões, Engelbert Mbarga fez uma ressalva à fala do colega: "O futebol do Barcelona deve muito aos jogadores brasileiros."
Polêmicas à parte, ambos disseram que, no curso, esperavam aprender técnicas que ajudassem a melhorar suas equipes.
"O futebol é algo muito importante na África. As pessoas ficam muito felizes quando há bons resultados e podem esquecer tudo, até dificuldades e doenças" diz Mbarga.
Técnico do Cachungo, clube da primeira divisão da Guiné-Bissau, João Dembi diz que suas equipes sempre adotaram o 'estilo brasileiro' de jogar e que Parreira era uma referência para ele.
Encerrado o evento, junto dos 15 colegas, Dembi caminhou até o camarim do auditório para tentar tirar uma foto com o brasileiro.
Sem sucesso: o técnico saíra às pressas para assistir ao show de Paul McCartney no estádio do Morumbi.
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