Um olhar diferente sobre a Guiné-Bissau

Para quem esteve habituado a visualizar através dos écrans imagens de palácios partidos, homens em guerra com mortes das principais figuras do Estado guineense, logo reactualiza-se com a vida que a cidade tem, quando lá chega.


Fazendo um pacto com a honestidade, Bissau não é uma cidade cosmopolita como outras que existem em África devidamente identificadas, mas não destoa tanto assim do resto das cidades africanas, capitais de países.
Ali, a guerra inviabilizou investimentos importantes, mas aos poucos vai procurando reganhar alguma coisa como a reabilitação de infra-estruturas rodoviárias, por exemplo.

Apresenta-se modestamente, sem mega-construções ou grandes centros comerciais e avenidas largas abundantemente iluminadas.
Bissau não tem mesmo sinais luminosos nas suas principais artérias que, reconheça-se, apresenta um tráfego que também provoca o caos automóvel, sobretudo naquelas em que o comércio informal predomina sobre todas as demais actividades.
Este é seguramente o caso do troço que parte do Aeroporto Osvaldo Vieira até ao centro da cidade. Ali impera a actividade informal consubstanciada no comércio, onde podem ser vistos os vários estratos sociais cada um a vender o seu produto, a sua quinquilharia.
No aspecto estético, nomeadamente na arquitectura, ela apresenta o estilo da cidade angolana do Dundo com casas cobertas de duas águas, sendo o material de cobertura variável de zinco ou telhas, com o tempo a roubar-lhe o brilho e a fortaleza da cor.
Até mesmo algumas instituições do Estado estão alojadas nestas residências de piso raso com um aspecto que nada abona para a dignidade de instituições como tribunais, repartições financeiras.
Mas, perscrutando o íntimo guineense logo chega-se a concluir que ela tem vida apesar dos constrangimentos acima apontados, embora nalguns aspectos se sinta o peso das dificuldades por que está a passar neste momento.
Os táxis são azul claro e branco, apenas os automóveis ligeiros, normalmente Mercedes Benz 190, e azul escuro e amarelo os conhecidos em Angola como macharrões também da anterior marca. Nestes há uma diferença a realçar que é a inscrição na sua chaparia do ponto de partida e de chegada, mas a balbúrdia é a mesma.
A luta pelo maior número de clientes também se sente ali.
Quanto ao preço da corrida não parece haver algo mais barato como pagar 200 francos CFA, quando uma nota de 100 dólares americanos é trocada a pouco mais de 40 mil.
O VERDE DEIXA BISSAU LINDA
Mesmo não sendo tempo de chuva, que só começa em Maio até Outubro, a capital guineense exibe de forma exuberante um manto de verde reconfortante para a alma dos ambientalistas e ecologistas. As árvores funcionam como um verdadeiro filtro do ar e das poeiras que pairam sobre algumas ruas da cidade.
Aliás, há mesmo uma instituição governamental que cuida da biodiversidade, palavra que pode ser encontrada em folhetos sobre esse país acolhendo os visitantes com um “bem-vindo à Guiné-Bissau terra da biodiversidade”.
É, de facto, reconfortante contemplar a beleza da natureza de um país com grandes recursos nesse domínio, mas que ainda não os explora para o bem do desenvolvimento local. O almoço no Mar Azul deixa a certeza da riqueza do seu potencial em frutos do mar, tal é o tamanho das gambas ali saboreadas gostosamente.
No aspecto social, as pessoas são comunicativas mas a diferença do padrão de português ali falado dificulta a comunicação sem ruídos na língua de Camões.
É que o crioulo é o meio de comunicação mais utilizado pelos guineenses ao qual agora se associa a predominância do francês não só devido à proximidade fronteiriça com os vizinhos, como também pelos investimentos que vêem de cidadãos de origem francesa.
No hotel onde a delegação angolana esteve hospedada, por exemplo, todos os canais de televisão estavam formatados na língua francesa, o mesmo podendo-se ver na comunicação coloquial, quando se pretenda dissipar dúvidas ou cumprimentar.
Em poucas palavra, o português abeira-se de ser considerada uma língua para eruditos e trilhar os caminhos do latim actualmente circunscrito aos estudiosos à igreja romana, pois ela terá morrido para o povo que é quem dá vida às línguas com a sua fala.
Não se podendo já concluir que Bissau seja uma cidade multicultural, há indícios claros, entretanto, de que por lá habita gente de vários quadrantes do mundo.
TV ANGOLANA NOS LARES GUINEENSES
O André, jovem balconista do Bar Tamara, foi claro em dizer que a televisão local só emite a partir das cinco da tarde e com uma programação sofrível. Por isso, disse, “preferimos ver os canais da TV angolana seja ela privada ou estatal”.
Como veículos de transmissão de cultura, o presidente Malam Bacai Sanhá aponta esta “invasão” da TV angolana como um elemento fundamental para cimentar as relações entre os povos. “Isso é que é aprofundar as relações”, admitiu.
Com um grande peso das transacções do mercado informal, a economia guineense tem, entretanto, boas perspectivas de investimento privado que poderão gerar postos de trabalho e riqueza.
Apontou a intervenção de grandes empresas europeias no leste do país que estão a gerar empregos além de instituições que financiam actividades suportáveis com o micro-crédito, algo que o presidente reputa de fantástico.
Aliás, já funcionários diplomáticos angolanos alertaram para este facto pedindo aos empresários angolanos a acorrerem à Guiné-Bissau para investirem o seu capital, gerar emprego e riqueza.
Neste momento, o grande investimento angolano é suportado com fundos públicos aplicados no projecto Bauxite Angola que as autoridades guineenses reputam de o maior investimento já alguma vez feito em Angola.
Cerca de 400 milhões de dólares foram investidos na exploração do minério de bauxite e não se ficará por aí, pois as autoridades angolanas vão construir um porto de águas profundas, um ramal de caminho de ferro que ligará Buba a Boé e daqui até à fronteira com o Senegal.
Os problemas de reconhecidos de pobreza e outras injustiças sociais só poderão ser resolvidos com estes investimentos que tanto as autoridades da Guiné-Bissau almejam para fazer desenvolver o país.
Eugénio Mateus Enviado à Guiné-Bissau
30 de Março de 2011
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